Saudade.

Para mim a saudade é um dos sentimentos mais puros que existem. Se sentimos saudade, é porque realmente gostámos de algo, da pessoa, do momento, seja do que for. Pois bem, a Inês e o Bruno ainda não partiram e eu já sinto saudades do que vivemos e de tudo aquilo que jurámos viver. 
Os cafés que tomámos, os jantares que tivemos, as saídas à noite e mais ainda, já sinto saudades dos cafés que não vamos tomar, dos jantares que não vamos ter, dos telefonemas que não existirão enquanto farei a A1/A8 em altifalante e de tudo aquilo que nos vai passar ao lado e que com franqueza tentaremos condensar e resumir alegremente num ecrã com o Skype ligado.
Infelizmente são mais um exemplo no meio de outros milhares que emigram, porque no país  em que nasceram, em que estudaram, em que investiram, esse mesmo desistiu deles insistindo que não há oferta de emprego para eles a não ser em condições precárias que abarrotam por quem enriquece a roubar o comparsa. Não insistam em negar, é o que mais há e denunciam-se alguns deles na primeira pessoa, nas minhas consultas. Arrancam-lhes do peito a casa, reviram-lhes as entranhas ao afastar a família a dois filhos únicos. Só outro filho único como eu para compreender o estoma que ali rebenta e teima em não cicatrizar. Eles seguem para Moçambique a 3 de Dezembro, pouco antes do Natal embarcar numa aventura destas, é dose! E como não há duas sem três, a seguir segue o Ano Novo! Nunca me vou esquecer do nosso último jantar, das vezes que olhei para eles a memorizar os traços do rosto, o brilho do sorriso, como pegavam no garfo, as expressões que os caracterizam e a constatar que a tristeza já morava no meu rosto, no preto da minha roupa, no luto da minha saudade. 
Eu admito que sou egoísta quando afirmo que gosto de ter em meu redor todos aqueles que mais amo e, este casal está nesse grupo, admito também que não coloco o meu bem estar em detrimento dos que me são mais próximos, mas repito, custa-me como o caraças vê-los partir. 
Nunca me vou esquecer de como saí do carro, a dizer que não gosto de despedidas, que choro sempre e que lhes desejava e desejo o melhor do mundo, muito sucesso, que vai correr tudo bem e que em breve estaremos juntos, que eu preciso lá de uma casa para ir passar férias e que enquanto estarei a comer num restaurante gourmet um patê qualquer, enquanto eles em casa estarão a deliciar-se com camarão tigre até o enjoarem! Eu prometi, zelar e esperar por eles. 
Eu prometi.
Mas bem no fundo da minha garganta o nó não desapertou, senti-o a alegrar-se por ver as lágrimas da Inês e no aperto do meu braço pela mão do Bruno. Lembro-me de tentar sorrir já fora do carro, mas ao virar as costas corri para largar as lágrimas que teimavam em surgir.
Hoje, escrevo com lágrimas nos olhos, escrevo com ardor na garganta, escrevo com a vista turva... Vocês teimam em dizer que vão numa aventura, que agora desejam-na e que se não aguentarem, regressam. Apoio-vos nas vossas decisões, mas tenho medo do que possa acontecer nesse país inconstante.
Têm-me dito que tenho os olhos vermelhos, desculpo-me com o cansaço, em parte é verdade, mas a tristeza dá-nos este rubor, dá-nos dureza no olhar, dá-nos sorrisos incertos, mas sempre breves. E eu não quero que a tristeza me dê nada, só quero que me devolva quem provoca em mim esta saudade que não passa, mesmo antes de chegar.

Peço a Deus, seja Ele quem for e o que for, que vos proteja, e que vos traga de novo da mesma forma que vos conheço, felizes! 

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