E de repente já é Natal.

Em 30 anos suspeito que tive 28 Dezembros felizes, todos eles seguidinhos. 
A alegria, o amor e a ternura, em 30 anos nunca falharam, começam sim a faltar pessoas. A primeira foi a minha avó Floripes, mas eu tinha 2 anos e as memórias são feitas de fotos felizes. Depois o meu avô Manuel, mas era o meu avô de fim-de-semana. Poupado nas palavras, afectos conheci-lhe poucos pelo seu jeito de ser, mas a verdade é que o meu pai ficou sem pais bem cedo e sendo o mais novo de seis irmãos, poucas palavras lhe conheço e conheci sobre este assunto, sem lhe serem feitas perguntas. Não é fácil ficar sem pais, sentir que os prolongamos na nossa vida com as memórias, os sonhos e a partilha de alguns momentos em voz alta. Depois, perdi o Pedro. Aqui o laço sentimental já escondia o forte nó que lhe tinha, porque o queria sempre por perto. A tragédia bateu-nos a todos de frente e por ser bem mais novo que todos nós, doeu mais. A minha idade já não refletia infância ou adolescência, a percepção de que a vida nunca mais será a mesma é óbvia. E depois disto tudo, as rotinas e o voltar ao normal do dia-a-dia é mandatário. A fome surge, o padeiro volta a apitar e os dias vão seguindo a sua ordem e de repente já é Natal. Dou comigo a desejar que o dia chegue rapidamente para ter a certeza de que quem ainda é vivo chegue ao dia de Natal, acho sempre que tragédias nesta altura do ano, são mais difíceis de suportar, a morte devia tirar férias nesta quinzena. Depois, porque há uma casa nova que deve chegar no próximo ano e preciso enfiar todos os que restam lá dentro e nem que seja só uma fotografia com o olhar, manter esse momento imutável e oferecê-lo à memória para o futuro, quando formos cada vez menos. Se é uma visão triste da quadra natalícia? Acho que não. Sinto-me realista perante o que a vida me fez. A alegria está cá, a gargalhada também, mas há momentos da vida que são vividos à caracol, arrastamo-nos, voltados mais para dentro, mais encolhidos sobre nós mesmos.  
Há disparates e alegrias momentâneas que só conseguimos com crianças por perto. E isso é o que nos está a faltar e possivelmente, num futuro próximo resolver-se-á, mas daqui até lá podemos viver estes dias mais contidos, até mais tristes, certos de que a união de quem ficou ainda se vislumbra. A mesa ainda não está assim tão vazia, mas quem não está deixou um vazio que vendido à grama é muito mais rentável que muitos produtos aos quilos. 
Acho que os Natais do meu pai não têm sido fáceis, mas ele tem conseguido seguir em frente, eu vou  simplesmente fazer o mesmo. Até porque não me sentir feliz nesta quadra, não significa obrigatoriamente estar triste, há dias em que estamos assim-assim, tal como as reticências, também eu não estou só. 

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