Desabafo.
E eu falei.
Falei com a voz calma, de coração tranquilo, mas com os joelhos a tremer, quando nos olhos dele lhe vi as lágrimas de quem finalmente vê na alma, a lama que o meu coração traz. Trazia.
Finalmente o nó desenrolou sem precisar de ser cortado. A linha saiu sem aumentar o buraco que precisou de fazer para entrar. O peito deixou de pesar, o coração esse voltou a aliviar, mais brando. Hoje em meses o sol apareceu, a filha única que sempre fui, agora partilha espaço reservado com o meu nome inscrito a bold. Porque adoptam os pais de filhos únicos o genro, se não quiseram ter mais filhos?
Há tanta coisa que não percebo, tantas incertezas são ilhas num mar incerto de maré alta, maré baixa. Não navego num barco a motor, mal remo com braços tão finos e compridos. Deixo-me levar pela maré, quando tenho a certeza por onde quero navegar. Mas o amanhã traz certezas que hoje não tenho, traz maleitas que hoje não imagino e traz dor que hoje não sinto.
Sempre fui de dizer o que sinto, sem rasgar o silêncio para dizer mal, tenho o meu caminho bem traçado, sei por onde quero ir e sei melhor ainda quem não quero por perto. Sei também que não existem pessoas más, mas quem queira fazer mal e magoar só porque sim, e desses, não preciso. Sugam-me a energia, acinzentam-me os sonhos e magoam-me o peito. Mas esses são também momentos sempre transitórios de quem voa mais alto que Ícaro em dias impares de quem caminha lado-a-lado com o seu par. E vou ouvindo o doce queixume de um teclado contente pela necessidade do desabafo, na saudade de quem teima em primeiro sentir dor, para depois ter prazer. O silêncio é rei, num coração de corda. O fiel sisal vai-se enlaçando e desconstruindo a ideia da união sem prisão. Haverá algo mais bonito, do que amar por completo? Não querer, mas estar agarrado a quem está a nosso lado? Acho que não. Mas também acho que é algo extremamente aterrador, e eu também tenho medo.
Muito medo do escuro.
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