A morte e... um dente de leão.


São duas noites dormidas, duas noites em que vejo os sorrisos do Flávio e do Diogo. Brandos, claros, mas abertos. 
Depois chega a mulher de capa negra, a mulher que todos tememos em dizer o nome, a morte. É a mais odiada, a mais irascível, a mais humilhante. Nada ficou. Está escuro e eu tenho medo. 
Dei comigo a berrar-lhe, a cuspir-lhe no manto, a tentar argumentar e envergonhadamente pedi substituição, por mim, pelos mais velhinhos, todos os que têm mais de 90anos - para mim são velhinhos. Ela perguntou-me quem eu era para lhe pedir tal favor, gritei o meu nome, sem medo que o decorasse, afinal ela tudo pode não saber, mas dia e hora marcada já temos. Disse-me que era o destino deles. Mas que destino colhe pessoas em peregrinação? Que Deus existe que não os proteja? Quantas tragédias são precisas acontecer? Disse-me que não queria saber o latim que insistia em advogar, nem tinha que me responder, estava só a fazer o seu trabalho. Mas que trabalho é esse o teu, quando só dás trabalho aos que sobram? Como sarar feridas que só o tempo atenuam? Como curar uma mãe sem filho?
Disse-me que ela era como uma borracha, apagava quem escreveu a lápis. Não, não acredites nisso. Tu não és isso. Tu és muito menos que isso. És o verme que come as sobras. Tu és o vazio que ninguém quer, és a escuridão de quem veste o luto, és a face de quem já esqueceu como se ri. E eu hoje atrevo-me a definir-te de outro modo. A morte dos meus meninos é como o vento forte num dente de leão. Eles sobem, espalham-se pelo ar e multiplicando-se polvilham jardins. Hoje rogo-te em beleza, com amor e saudade, mesmo no terror, existe fraternidade, carinho e louvor. Provocas união mesmo num abraço de quem mal se conhece. 
Provocas dor que, em alguns momentos, é também sinónimo de amor.

Hoje a sair na A1, um chefe de outro agrupamento perguntou-me como estávamos, que mesmo à distância, era só dizermos o que precisávamos, a necessidade seria resolvida na distância de um telefonema. 
Disse-lhe a verdade: Estamos de rastos.

Fairy, há 15 dias passei a manhã contigo no parque verde em pleno BTT de Mrt, recordo bem o som das tuas gargalhadas de cada vez que trocavas os braços na sinalização aos participantes. Vocês são feitos de luz, guardem-me um lugar junto a vocês, terei imenso para vos contar - de como a saudade já se faz notar, de como foram e são amados, por mim - por todos.

1241 - somos um.

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