Geração tupperware.

Eu e os nascidos entre 85-90 pertencemos a esta geração. Podemos alegremente discutir a faixa etária por mim designada, mas falo em meu nome, com idade entre os 25-30, algures bem ali no meio. 
Fiz o ensino secundário, ingressei na faculdade e o meu sucesso académico permitiu-me a qualidade de vida que tenho hoje e ingressar no doutoramento. Tenho a sorte (mas que me dá muito trabalho) de não depender economicamente dos meus pais, desde que comecei a trabalhar; no entanto, bem sei que tudo o que tenho, lhes devo. De que me valia uma massa encefálica igual à que tenho sem as oportunidades que eles estoicamente me proporcionaram? Honestamente - ressentimento. 
Mas o que sinto mesmo é que resultante do nosso sucesso cá em casa, surge a amarga realidade de estarmos longe de "casa". Tal como eu, muitos abraçaram uma actividade profissional longe da casa que nos pariu. Abandonámos as paredes que nos engoliam enquanto chorávamos os desgostos de amor da secundária, largámos a cama onde sonhámos a vida que hoje temos e deixámos para trás quem sempre nos colocou à frente de tudo - os nossos pais. 
Eles também o fizeram, noutros tempos, noutros modos, noutro jeito, é certo. Mas acho que o fizeram com a força da ideia de uma precoce e ingénua idade que o casamento (na altura, quase obrigação) dar-lhes-ia uma vida melhor. Na maioria, foi o que aconteceu, os meus pais são prova disso. 
Nós não. 
Nós saímos de casa, para quartos alugados aos 18 anos, inconscientes de que ainda não somos adultos, certos que não precisamos de dar satisfações, porque nós somos os nossos horários e precisamos apenas de ir à faculdade, passar de ano e esticar a mesada até ao fim do mês.
O que sai de casa conosco, quase de braço dado nesse preciso momento são os tupperwares. Vêm com o amor das nossa mães embalados num puro sentimento de que já que elas não podem andar sempre de mão dada conosco, serão os seus tupperwares a cuidar de nós. Primeiro, porque assim o trabalho que temos é menor, porque um filho bem alimentado, é bem criado e porque o que lhes interessa em mil telefonemas numa semana é: "O que é que comeste?""Já comeste?";"Já jantaste? Foi o frango ou a carne de vaca que te mandei?"...
Os anos passam, os tupperwares mudam, os sentimentos mantém-se, tal como a distância física. Ajuda muito os tarifários de telemóvel que nos permitem minutos "grátis", mas as perguntas mantém-se no seu género, mas em menor frequência é certo, muda apenas o nosso descuido em relação aos ditos cujos. Há uns anos a minha sobrevivência dependia dos tupperwares que me ajudavam a controlar a despesa mensal, hoje em dia a minha sobrevivência depende da devolução de tupperwares à minha mãe e à minha sogra: elas matam-nos se não os devolvemos. Sei que a casa está mais vazia, sei que o cozinhar para nós é uma extensão do amor deles, mas sei também que pior que uma casa vazia é um armário sem tupperwares.

"Ó Patrícia, o André vem cá este fds? Diz-lhe para ele trazer os tupperwares!!! Eh pá... Não há cá nem um de jeito!"

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