Amar na diferença.

Um relacionamento longo, é como comer uma francesinha todos os dias, iguaria que eu adoro. Já sei identificar o sabor, sei como é confeccionada, o que mais gosto e o que menos aprecio, se bem que o molho (esse agente secreto) pode oscilar: o medo é sempre o mesmo, irei enjoar? Ora bem, já sei o que ele pensa, o que ele vai dizer, como ele age ao conversar, mas tal como o molho (o tal principal ingrediente da francesinha) há flutuações. Essas mesmas que me fazem vibrar de felicidade se forem boas e as que me provocam agonia, se forem menos boas, em estado puro de tristeza, pelo menos na minha perspectiva. E é assim que eu vejo os relacionamentos longos. O meu já celebrou dez anos. No início é tudo muito bonito, as horas quando estamos longe não passam, as em conjunto voam, o primeiro beijo, a primeira ida ao cinema, tudo aquilo que me provoca "borboletas no estômago" de certa forma já lá vai. A derradeira paixão, dá lugar ao amor, a incerteza perde o prefixo e bem, tudo o que veio de seguida, veio para melhor, daí termos continuado como estamos hoje: juntos e prestes a  dar o próximo passo, vamos casar. 
Mas os anos que passaram parece que foi a madrugada anterior, passaram num instante, momentos muito mais felizes do que os menos bons, mas a fórmula secreta para manter uma relação está ainda por ser descoberta, pelo menos por mim. 
Em abono da verdade, sei que a pessoa que escolhi para meu marido, é o meu grande amor, tive a sorte de o conhecer aos 20 anos e muito lentamente, foi um amor que veio para ficar. Ele revelou-se um príncipe e no meio de aventuras e desventuras descobri uma rapaz bem parecido e semelhante ao que nos meus sonhos tinha rabiscado.
Mas nada tem só um lado bom, tudo tem o seu mau, mesmo a melhor francesinha tem um fim e deixa-me sempre empachada e de que maneira! Neste caso, como continuar a amar uma pessoa que nem sempre entendo, que não concordo totalmente com o que faz, que eu magoo, que eu entristeço e que mesmo estando quase ao nível da perfeição, há sempre alguma coisa perceptível e preferível de ser mudado? Como?  
E é aqui que, a meu ver, reside o segredo da duração da relação. Não a vejo como um acomodar, vejo sim duas pessoas a quererem o mesmo em momentos semelhantes: estarem lado a lado com o mesmo propósito. Há uma grande percentagem de falhanços em pessoas que se amam, mas que não estão em sintonia. Resume-se ao mesmo de sempre: sorte e muito trabalho! Eu costumo dizer (para exemplificar o que acima afirmo) que alguns casais são como o rádio, um está em FM e o outro em AM. Vê-se, frequentemente, quando um casal está bem mas ela quer ter um filho e ele não, ele quer casar e ela ainda não se sente preparada, ele quer ir morar com ela, ela ainda não, etc. Um infinito exemplo de coisas em que a expressão o amor não chega, acaba por rematar o assunto. Eu já estive nesta situação, mas a minha vantagem ou não, foi que inconscientemente ou não, eu esperei por ele e ele esperou por mim. Não sei se por não haver melhor (não acho que uns são melhores que outros em pleno significado da palavra, acho sim que é por afinidades, há muito boa gente a quem eu simplesmente não ligo patavina e estou no meu direito) no mercado, se foi efeito do mero acaso. Sei sim, que foi o que nos aconteceu. 
Adiante, como faço eu para continuar a amar quem me magoa? Sim, os meus pais magoam-me e eu a eles, mas não deixam de ser meus pais e eu filha deles. Eu falo das pessoas que escolhemos e nos escolheram a nós para construirmos uma família. Quando numa lista de convidados não conseguimos sequer um acordo a 100%.
Como?
Sim, alguém tem sempre de ceder, mas cedemos ora eu, ora ele. Eu já cedi duas vezes, ele cedeu seis, mas desta vez eu acho que estou mesmo certa e ele não quer ceder, senão a diferença aumenta de quatro para cinco?
Canta o Rui Veloso que o segredo está no "é mais o que nos une, que aquilo que nos separa" e eu concordo. Enquanto o saldo é positivo, é para manter. Mas todos sabemos que a tristeza, a mágoa e a dor corroem um coração feliz, que insiste em abrir a ferida, como o sal em sangue - arde. 
E sinto que na prática resolve-se a situação, com um não vou responder, vou fazer de conta que não ouvi, que não li, que já me esqueci, mas a ferida está sempre lá, dói, porque quem nos magoa mais são aqueles que mais amamos. A fasquia está sempre muito mais elevada para quem nos é próximo. Sei também outra boa forma de me esquivar ao problema que apresento sem solução: dar como certo e garantido, apenas os meus pais. Esses até hoje nunca me falharam, todos os outros são carta fora do baralho, tudo o que vier que venha por bem, para melhor, para ficar.
Porque eu quero ficar ao lado dele, enquanto ele me quiser.
Resta-me manter os meus treinos, vigiar o LDL/HDL  porque honestamente, eu adoro francesinhas!

Comentários

Postagens mais visitadas